quarta-feira, 23 de julho de 2014

Irmão Tareco

IRMÃO TARECO
São Francisco de Assis nutria um especial carinho pelas criaturas e, abrangendo-as, pelos animais. Toda a gente já ouviu falar do célebre encontro com o lobo de Gúbio. Para Francisco tudo derivava deste princípio básico e estruturante: somos irmãos de todos os seres vivos porque basicamente todos temos algo em comum: a nossa dependência de Deus. A descoberta do sentido da Paternidade de Deus, torna-nos a todos irmãos, solidários, corresponsáveis neste mundo de todos e para todos. É assim a visão franciscana da vida, a mundividência franciscana. 
Vem isto a propósito da visita do Tareco.
Tareco é o gato de uns familiares próximos que vai estar connosco uns dias. Já tinha estado no ano passado e este ano volta a repetir a façanha. Chegou, ambientou-se, ficou, sem lamúrias nem reprimendas. É verdadeiramente um gato especial. Limpo, asseado, calmo - acho que inteligente e culto - tem passado o tempo numa quieta azáfama alegre e prazenteira de nos observar, cheirar, roçar pelas nossas pernas, como a dizer-nos: "estou aqui a dar-vos o que tenho de melhor - o meu carinho por vós!"
A forma como nos olha e penetra, dá-nos a sensação, por analogia, que estamos noutra dimensão, mais interior, mais espiritual, que apela para algo indizível, talvez inefável.
A sua presença noctívaga pela casa faz-se de um saber estar, um saber comunicar a sua imensa alegria de nos ver por lá, juntos de si. Quando chego, às vezes um pouco tarde, o Tareco lá está à espera e depois rebola-se na sala, pedindo uma carícia, miminhos, numa atitude de encantatória ternura. Agora compreendo como há pessoas que não conseguem viver sem os seus animais e companheiros, prediletos e inseparáveis.
A presença do Tareco entre nós, por outro lado, "obrigou-nos" a mudar para uma atitude mais calma (há mais silêncio, menos gestos precipitados, menos movimentos bruscos, a aproximação deve fazer-se lenta, como se estivéssemos a realizar um filme em câmara lenta, ao ralenti), mais concertada, para evitarmos que se assuste, que fique em pânico ou que reaja abruptamente e se refugie na casa de banho, enroscado num tapete ou arrumadinho numa caixa de sapatos abandonada.
É bom saborearmos estes momentos todos juntos. O nosso filho, Francisco anda excitadíssimo e só precisa de moderar um pouco a sua agitação interior para tirar todo o proveito desta experiência encantadora. A Gisela acha-o um mimo e uma adorável ternura. Eu converti-me franciscanamente ao cântico do irmão Sol e do irmão Tareco.
Leonardo Santos


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